sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Cabelos

No autocarro no último ano tenho reparado numa mulher que se tornou passageira habitual. Tenho quase a certeza absoluta que é uma imigrante de leste. Tenho a ideia que a ter ouvido falar num idioma dessa região com a filha. O que me chamou a atenção nela foi o cabelo. Da primeira vez que reparei nela trazia o cabelo cor-de-laranja. Sim, quase tão laranja como a casca do próprio fruto. A filha é loura, tem um longo cabelo ondulado louro. Com a passagem do tempo o cabelo da mãe foi ficando amarelo até atingir um louro muito claro. Ontem voltei a reparar que mudara outra vez de cor. Agora é castanho, nem muito escuro nem muito claro.

Ninguém está contente com aquilo que tem ou é. Digo isto porque tenho reparado na ironia que é ver as mulheres portuguesas, não todas, mas muitas, que são morenas a quererem ser louras e por outro lado outras que são louras a quererem ser morenas. Acho muita pisada quando vejo imagens do norte da Europa e aparece sempre por lá uma mulher de cabelos bem escuros.

Acho natural que no sul da Europa se encontrem mais louros e louras naturais do que morenos no norte. Nos séculos passados as classes baixas tinham como ideal de beleza a imagem dada pelos ricos. Ou seja, o povo que vivia da agricultura era normalmente moreno de cabelo e de pele queimada pelo sol. Já os ricos não eram assim, a pele era bem mais branca e graças aos casamentos de conveniência com nobre de outras nações, o cabelo também era louro. A maior parte da iconografia religiosa desde a idade média apresenta com ideal de beleza o protótipo do norte-europeu. Só desde o século XIX é que começou a haver uma maior circulação de genes capilares.

Em primeiro lugar acho que cada um pode fazer do seu cabelo o que quiser. Mas em segundo parece-me que muita gente anda equivocada com a sua identidade. Pintar o cabelo é uma forma de ser outra coisa do que aquilo que se é. Sei que é também uma forma de beleza, de a pessoa sentir-se bem, de se valorizar.

Lembro-me pouco dos professores que tive. Dos poucos que recordo há o de Filosofia do décimo primeiro ano que me marcou com várias coisas. Uma delas foi ter afirmado que o natural é bom. Realmente por definição se algo é natural, é algo corrente, habitual, transmite uma sensação de fluidez, de segurança, tudo aspectos positivos. Essa afirmação marcou muito os meus critérios de avaliação. Se algo é natural, então deverá ser bom, positivo, sem necessidade de mudar. (Lembro-me também a afirmação de um colega meu “ó stôr, uma vez caí numa pocilga de porcos e não achei nada bom”) Usando o critério da naturalidade, acho curioso que as pessoas insistam em pintar o cabelo, mais ainda no caso das nórdicas.

No caso das louras do norte da Europa que pintam o cabelo para serem morenas, mais me impressiona porque o meu ideal de beleza, o meu estereótipo, está na cor de cabelo loura, olhos azuis e corpos longilíneos. Cada pessoa é um mundo e o meu ideal de beleza deverá ser mesmo diferente do da maioria. É assim com todos. O ideal de beleza dos nórdicos parece ser o tipo mediterrâneo. Gostos...

Mais ridícula acho a mania que muitas mulheres têm, ao chegarem à meia-idade de se transformarem em louras. Percebo que é uma forma de não mostrar tanto os cabelos brancos, sempre dá para disfarçar a ausência de tinta nas raízes. Percebo, mas acho ridículo.

Por último, acho que a moda de fazer nuances ou madeixas é uma forma relativamente acessível de uma mulher transmitir a mensagem de que pertence a uma classe social elevada. Alguém com um cabelo longo, multitonal de castanhos-claros, com uma roupita da Zara já passa por advogada, por mulher de negócios, por mulher independente financeiramente e não só. Mesmo que ganhe pouco mais que o ordenado mínimo.

Hoje estou a exagerar na escrita e no azedume. Gabo a pachorra a quem tenha lido isto até ao fim.

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